Jesus, aproximando-se, falou-lhes, dizendo: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Portanto, vão e façam discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a guardar todas as coisas que tenho ordenado a vocês (Mateus 28.18-20).
Você é devoto ou discípulo de Jesus?
Essa foi a pergunta que veio à mente quando um conhecido pastor estava em Canindé, no Ceará, sentado à beira da estátua de Francisco, esperando uma van para a sua cidade de destino. Ali ficou observando os milhares de devotos de Francisco de Assis e ouvindo suas preces e rezas. Pensava: “Se todos os devotos de Francisco fossem seus discípulos, certamente iriam influenciar o mundo da mesma forma como ele influenciou”. Contudo, o que via era apenas pessoas que o adoravam, admiravam suas palavras, obras e feitos, faziam pedidos em seu nome, crendo que Francisco teria acesso mais direto com Deus. Em nenhum momento tiveram coragem de segui-lo, como discípulos, e entregar a vida, assim como Francisco. Eram apenas devotos, bons devotos, admiradores de Francisco de Assis, religiosos, mas não discípulos, seguidores, imitadores.
Ali se deu conta de que assim caminha a igreja, incluindo ele mesmo com certo constrangimento: homens e mulheres que admiram as obras de Jesus, apreciam suas palavras, o consideram santo e tão próximo de Deus que até fazem pedidos em seu nome, mas não se tornam seus discípulos. Apenas devotos, bons devotos, admiradores de Jesus, religiosos, mas não discípulos, seguidores, imitadores.
Justamente para combater religiosidade vazia, Jesus, em suas últimas palavras antes de subir aos céus, revela claramente a igreja que ele sonhou e deixou de presente para o mundo: discípulos que fazem discípulos. No original do grego, Jesus utilizou-se da voz média para o verbo ir e o imperativo para o verbo fazer. Isso significa que não vou primeiro, para então fazer discípulos, mas devo fazer discípulos enquanto e por onde vou. Destaca-se também que a ordem não é para fazer crentes, nem devotos, nem membros de igrejas, nem seguidores de si mesmos, nem consumidores de serviços religiosos. A ordem é para fazer discípulos. Somente consigo fazer discípulos de Cristo quando sou um deles. Somente posso reproduzir a semente que recebi, a natureza que ganhei, a riqueza que herdei. Esse discipulado tem algumas dimensões destacadas nessas últimas palavras de Jesus.
Discipulado de autoridade: Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra. Na visão de Jesus, tudo começa na autoridade e no poder que recebeu no céu e na terra, na dimensão natural e espiritual. Autoridade no céu, na dimensão natural, é exercida sobre o Universo (Isaías 40.26); na espiritual, é exercida sobre anjos, potestades e poderes (1 Pedro 3.22; Colossenses 2.10, 15; Efésios 1.20, 22). Autoridade na terra, na dimensão natural, é exercida sobre a natureza (Marcos 4.41; Daniel 7.13-14); na espiritual, é exercida de maneira completa e cabal sobre a morte (1 Coríntios 15.54; Apocalipse 21.4). De fato, essa era a impressão com que ficavam todos aqueles que ouviam Jesus: Quando Jesus acabou de proferir estas palavras, estavam as multidões maravilhadas da sua doutrina; porque ele as ensinava como quem tem autoridade e não como os escribas (Mateus 7.28-29). Todos se admiraram, a ponto de perguntarem entre si: Que vem a ser isto? Uma nova doutrina! Com autoridade ele ordena aos espíritos imundos, e eles lhe obedecem! (Marcos 1.27). E muito se maravilhavam da sua doutrina, porque a sua palavra era com autoridade (Lucas 4.32). Porque Jesus tem autoridade, pode delegar aos seus discípulos para viverem de maneira verdadeira, coerente, consistente.
Discipulado de doutrina: batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. O ato de batismo significa muito mais que a quantidade de água. Implica em inculcar a realidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Isto mesmo: a Trindade está ativamente presente no discipulado, fato que desemboca na sã doutrina baseada na Palavra. Fazer discípulos vai além de simplesmente evangelizar. Inclui caminhar junto com base na Palavra, como Jesus mesmo sugere a seguir, guiado pelo Espírito Santo, na direção da presença do Pai. É claro que discipulado não é só de palavras, mas tem palavras, sim. Não qualquer palavra, mas a Palavra.
Discipulado de modelo: ensinando-os a guardar todas as coisas que tenho ordenado a vocês. Só ensinamos a guardar se também tivermos aprendido a guardar. Só ensinamos a guardar se estivermos perto o suficiente. O modelo de ensino de Jesus não é teórico, mas prático; não é transmissão de conhecimento, mas de modelo de vida; não é informativo, mas formativo; não é só de palavras, mas de testemunho; não é oco, mas consistente; não está baseado em nós mesmos, mas em Cristo. A maneira como melhor aprendemos é pela influência do modelo que recebemos. Todo modelo deve exalar fé genuína (2 Timóteo 1.3-5; 3.14-17), sem estereótipos, sem buscar impressionar outros, nem construir boa reputação. Gente que crê para valer influencia a fé de outro nos momentos de alegria, mas também de tristeza; de tranquilidade, assim como de adversidade.
Discipulado não é dominação, mas é serviço baseado no amor; não é transmissão de conhecimento, e sim transmissão de vida; não é um programa, mas um estilo de vida; não é só para novos convertidos, é para a vida toda; não é ministrado só por líderes, mas também por jovens e pais na fé; não é instantâneo, e sim um longo processo; não é feito seguindo fórmulas, mas feito na direção do Espírito Santo; não é impessoal (por exemplo, via TV ou on-line), e sim relacional (olho no olho); não é bajulação, é assertivo; não aponta para si, mas aponta para Cristo.
A vida com Cristo é e sempre será um santo discipulado. Nessa escola, temos a data da matrícula, mas nunca nos formaremos, pois ela nos transforma progressiva e continuamente em pessoas mais parecidas com ele.
Rodolfo Montosa